De perdas mensais de 2,6 milhões de dólares à obtenção de rentabilidade, de que forma a Medium “sacrificou uma parte essencial para sobreviver”?

Intermediário7/29/2025, 2:47:02 AM
O artigo relata como a empresa procurou ultrapassar crises financeiras e o declínio da qualidade do conteúdo. Também aborda uma estrutura de governação interna complicada. O texto inclui ainda a visão do autor, enquanto Diretor Executivo, sobre a necessidade de ajustamentos estratégicos, a reorganização da equipa e a condução de negociações com investidores.

Título original republicado: “Retrospectiva de CEO: De perdas mensais de 2,6 milhões de dólares à rentabilidade—Como a Medium regressou do abismo”

O destaque da Substack costuma dificultar a perceção de que a Medium continua bem viva.

A Medium atravessou, de facto, grandes dificuldades nos últimos anos—embora poucos além da equipa percebam a real dimensão do desafio.

Passou por múltiplas rondas de financiamento, mas os investidores perderam o interesse. A Medium esteve à beira da falência e liquidação. No entanto, graças a uma atuação arrojada, orientada para a sobrevivência e liderada pelo novo CEO, a empresa regressou à rentabilidade no último ano.

Esta retrospetiva analisa como a Medium enfrentou simultaneamente uma crise de qualidade de conteúdo e de dívida, relatando o percurso até à rentabilidade sustentável.

O CEO Tony Stubblebine descreve este processo como “cair num buraco e sair dele”. Neste caso prático, Stubblebine procura oferecer uma visão interna sobre o que significa gerir uma startup em crise—e, sobretudo, como a recuperação foi travada a vários níveis: financeiro, marca, produto e comunidade.

Para empreendedores, este artigo oferece ensinamentos práticos e acionáveis. A principal lição da experiência da Medium é que o fluxo de caixa e a rentabilidade são a verdadeira fundação de qualquer empresa. A rentabilidade traz independência—torna a empresa menos dependente de capital externo e permite-lhe recusar propostas de investidores, senhorios e fornecedores. Foi isso que permitiu à Medium sobreviver: gerar receitas reais.

Segue o artigo completo.

Fonte original: https://medium.com/the-coach-life/fell-in-a-hole-got-out-381356ec8d7f

Propus-me a contar o percurso que devolveu a rentabilidade à Medium—uma história pouco ortodoxa. Sinceramente, não sei se se justifica tanta transparência perante tamanhas dificuldades. Mas a transparência faz parte da cultura da Medium: se vivemos algo relevante, devemos partilhar.

O meu objetivo é dar uma visão de bastidores—o que é estar numa startup em apuros reais e como lutámos por virar a situação em todas as frentes: financeira, de marca, produto e comunidade.

No final, incluo ainda um resumo detalhado da nossa reestruturação acionista. Quero que a comunidade Medium perceba: o “trabalho de limpeza” ficou no passado. Neste momento, estamos totalmente focados em proporcionar a melhor experiência possível a leitores e autores.

01 Introdução

No fundo do buraco—e depois, escalar para fora

Em 2022, a Medium registava perdas mensais de 2,6 milhões de dólares. Os subscritores pagos continuavam a abandonar a plataforma, pelo que estas perdas não representavam sequer investimento em crescimento futuro. Internamente, sentíamos embaraço com o conteúdo que promovíamos como história de sucesso. Os nossos utilizadores eram ainda mais severos, chamando abertamente à plataforma “um mar de esquemas para enriquecer rápido”—e algo pior.

Depois, o mercado de capital de risco secou. Já não havia capital de investidores para compensar o saldo bancário em queda (e o nosso caso nem justificava investimento). Nenhum interessado queria adquirir uma operação complexa, em retração e dispendiosa. Restava apenas uma escolha: a Medium teria de ser rentável ou fecharia portas.

Havia problemas mais profundos—mas, felizmente, um núcleo resiliente queria continuar a ver a Medium triunfar. Esta história desenrolou-se tal como o clássico enredo do “homem no buraco” de Kurt Vonnegut: houve sucesso, caímos num poço profundo e, por fim, lutámos até sair dele.

02 Os Dias Dourados

Design minimalista e um modelo de negócio inovador

Os “bons tempos” da Medium começaram com o trabalho do antigo CEO Ev Williams, fundador do Blogger e do Twitter. Hoje, preside ao conselho de administração, é o maior acionista—e mantém contacto regular comigo, o CEO atual.

Ev delineou dois períodos distintos. O primeiro foi a “fase do design”: a equipa reinventou o conceito de plataforma de escrita, perseguindo uma experiência elegante e simples. O segundo foi o lançamento de um modelo de negócio totalmente novo: rejeitou os incentivos nocivos da publicidade em prol de uma subscrição agrupada única, que permitia a todos os criadores partilhar do sucesso da plataforma.

No entanto, este modelo de negócio tornou-se o maior desafio da empresa. A sua execução exigia realizar a visão de “um melhor espaço digital”, satisfazer leitores e autores, garantir sustentabilidade e travar oportunistas, spam e trolls. Era um equilíbrio extremamente difícil de alcançar.

03 A crise de qualidade de conteúdo na Medium

Em julho de 2022, assumi funções de CEO com duas prioridades urgentes: melhorar a qualidade do conteúdo e restaurar as finanças. Como já referi, o capital escasseava, mas o principal preocupava era a fragilidade do conteúdo que promovíamos.

Quando entrei, tínhamos já passado por múltiplas tentativas falhadas de elevar a qualidade—tal como a história de “Goldilocks”: primeiro, estratégias demasiado caras (falharam); depois, opções supostamente baratas, mas afinal dispendiosas (falharam na mesma). O “ponto ideal” parecia inalcançável.

Nota: A história de “Goldilocks” vem de um conto britânico clássico, “Goldilocks and the Three Bears”—ilustrando que todo o sistema tem um ponto de equilíbrio ótimo, que evita cair em extremos.

Justiça seja feita, a Medium conheceu picos de grande qualidade. O primeiro foi de 2012 a 2017, antes das subscrições—um espaço puro e vibrante para a escrita relevante. O segundo, de 2017 a 2021, graças a uma equipa de executivos e editores de renome, que produziu milhares de artigos de elevada qualidade.

O fim da fase editorial ficou a dever-se a razões orçamentais e de missão. Como utilizador e editor, sentia sobretudo a missão. Estratégicamente, pagar a especialistas para produzir bom conteúdo e atrair subscritores parecia lógico. Mas, na ótica da comunidade, era claro que estes “profissionais” excluíam a base—pessoas comuns com experiências verdadeiramente valiosas, mais propensas a partilhar aprendizagens únicas relevantes para o negócio. A Medium atinge o seu auge quando dá palco a quem não é criador profissional, mas tem lições práticas e autênticas para transmitir. A internet não pode ser domínio exclusivo de profissionais dos media, influenciadores, oportunistas e criadores. Tem de haver uma plataforma que valorize o conteúdo gerado por utilizadores, perspetivas especializadas e narrativas genuínas.

Como CEO, vi também o peso financeiro da “fase editorial”. Essa equipa de topo trouxe mais de 760 mil membros pagos—mas à custa de perdas financeiras volumosas. Reduzir esse défice era central ao meu mandato.

Depois da era editorial, enfrentámos 18 meses de degradação na qualidade. Como ironizou o investidor Bryce Roberts, “Se o teu produto oferece dinheiro, o encaixe no mercado é garantido.”

Dávamos dinheiro, na esperança ingénua de criar fidelização. Na prática, atraímos apenas autores motivados por incentivos rápidos.

No verão de 2022, as queixas dos leitores eram constantes: a Medium estava repleta de esquemas “enriqueça depressa”. O fundador Ev lamentava ver a plataforma tomada por clickbait e resumos apressados do trabalho de outros. O “manual viral” da altura: copiar a Wikipédia, inventar um título sensacionalista, reescrever num estilo pomposo e lucrar—alguns textos chegaram a render 20.000 dólares.

Concordei totalmente com Ev: o que define a Medium é a sua missão. Procuramos “aprofundar a compreensão”. Demasiado conteúdo pago e encomendado carecia de substância e afastava-se desse propósito. Isso levou à reflexão: afinal, porquê existimos?

Para resolver este desafio, lançámos o Boost—com curadoria e análise especializada das recomendações. Refinámos o Programa de Parceiros, premiando trabalho ponderado e relevante. Criámos ainda o Featuring, que permite às publicações destacarem peças em que confiam—convencidos de que o leitor deve decidir em quem acredita.

Nenhum destes processos foi fácil—nem os sistemas são hoje perfeitos. Mas os melhores artigos publicados atualmente na Medium são incomparavelmente melhores. Por isso, no último ano, pudemos afirmar com segurança que estamos a construir uma internet melhor—valorizando pensamento crítico e autenticidade e não desinformação ou divisão. Ninguém nos acusou de propagandismo; esse foi o sinal do progresso real.

04 Governação interna caótica

O capital externo perdeu confiança

Na fase mais difícil, dois grupos estavam ligados ao destino da Medium: investidores e colaboradores (além de leitores, autores e editores).

Os investidores perderam a confiança há muito. Não estavam disponíveis para apoiar uma reviravolta—algo habitual neste mercado. Alguns investimentos acabam riscado; quando isso sucede, os investidores seguem em frente. Fomos só mais uma aposta falhada.

Mesmo assim, contra todas as probabilidades, a nossa equipa quis reverter o declínio da Medium. Essa determinação era fruto do espírito base da plataforma, que motivou todos os colaboradores nos piores dias. A situação era, de facto, ainda mais grave do que relatei.

O futuro da Medium dependia do esforço contínuo desta equipa (e das possíveis futuras contratações)—mas a tomada de decisão e a distribuição do valor continuavam enviesadas em favor de investidores ausentes.

Tínhamos 37 milhões de dólares em empréstimos vencidos. Contabilisticamente, estávamos insolventes.

Além disso, os investidores detinham 225 milhões em preferências de liquidação. É um conceito comum em startups: em liquidação, os investidores são pagos antes dos colaboradores verem qualquer retorno. Em tempos prósperos, isso quase não importa.

Mas quando os ativos já não cobrem as dívidas, todos os anos de trabalho dos colaboradores ficam anulados e todo o valor transita para investidores distantes. Esse facto era devastador para o moral.

Resumindo, dívida e preferências de liquidação eram os dois grandes pesos que materializavam o verdadeiro custo de cair no abismo. E havia ainda mais—por transparência, é importante expor a dimensão do problema.

Receber investimento externo em grande escala deixou-nos uma estrutura de governação extremamente complexa. Podia esperar-se que o CEO mandasse, mas na prática eu dependia da aprovação dos investidores—cinco diferentes “tranches” de capital (todos já distantes). Os fundos de capital de risco habitualmente vendem participações a terceiros após alguns anos, pelo que o controlo da empresa pode transitar de investidores previsíveis mas afastados para desconhecidos e imprevisíveis sem aviso.

Adicionalmente, a Medium detinha e geria três empresas subsidiárias.

Este foi o verdadeiro fundo do poço. O melhor conselho que recebi: “Não tentes ser o herói.” Veio de um investidor, que observou como os fundadores tendem a confiar excessivamente na sua capacidade de resolver todos os problemas. Mas, nesta situação, a atração de talento e todas as grandes decisões eram sempre travadas pela necessidade de aprovação dos investidores. Mesmo a execução perfeita podia ser deitada a perder por um único investidor.

05 A única saída do “buraco”:

Rentabilidade e reestruturação de capital

Não ficámos sem caixa, não fomos vendidos a fundos de private equity, nem pedimos insolvência. Em vez disso, em agosto de 2024, a Medium alcançou rentabilidade.

Renegociámos a dívida com sucesso, eliminámos preferências de liquidação, consolidámos a governança num só grupo de investidores, vendemos duas subsidiárias e encerrámos uma terceira.

Agora olhando em retrospetiva, foi um feito enorme. Devido à persistência das questões de qualidade, cortar apenas custos não seria suficiente: focar só nos cortes garantiria a rentabilidade, mas à custa de vender conteúdo que nos envergonhava—um êxito comercial, mas um fracasso estratégico.

Precisávamos, por isso, de uma equipa capaz de inovar na qualidade (como já referi), mas também de cortar com decisão, encontrar vias de crescimento e renegociar com os investidores.

A equipa foi excecional. Penso que também estive à altura. Antes da Medium, fui fundador/CEO durante 15 anos em pequenas empresas, sempre com a ambição de alcançar rentabilidade desde o zero. Para mim, isso é o verdadeiro espírito empreendedor.

Mas trago duas “superpotências”: um conhecimento prático de gestão de pequenas empresas em todas as funções; e talvez seja o utilizador mais ativo da Medium nas redes sociais—usei a plataforma como autor, influenciador, empreendedor, criador de newsletters e fundador de três das maiores publicações. Quase 2% de todas as visualizações da Medium são da minha autoria.

06 Alcançar a rentabilidade

Crescimento de membros, redução de custos, ajuste da equipa

Para concluir a reestruturação, foi necessário um timing perfeito: a empresa tinha de ser promissora o suficiente para justificar a aposta, mas não tão bem-sucedida que os investidores resgatassem o capital.

Assim, além de melhorar a qualidade, focámos primeiro nas finanças. É disciplina financeira básica: estávamos a consumir liquidez, a tesouraria caía e o colapso era iminente.

Eliminámos um défice de 2,6 milhões de dólares/mês em julho de 2022 para um lucro de 7.000 dólares/mês em agosto de 2024. Desde aí, mantivemo-nos sempre positivos. Alguns lucros ficaram em reserva, mas o restante foi reinvestido na Medium.

A recuperação assentou em três pilares principais (não estritamente financeiros): crescimento de subscritores, corte de custos e ajuste da equipa.

  • Crescimento de membros. O nosso grande orgulho. Quando entrei, as subscrições encolhiam—os leitores estavam a sair devido à falta de qualidade. Hoje, é diferente. Ao repor padrões de qualidade, provámos que as pessoas pagam por conteúdo valioso—um voto real por uma internet melhor.
  • Corte de custos. Outro motivo de orgulho. A maior poupança veio da cloud, reduzindo despesas de 1,5 milhões para 900 mil dólares por mês, graças à engenharia e à disciplina orçamental. Internamente, tínhamos o lema da “escada”: cada degrau era poupar ou gerar 10.000 dólares. Viesse de poupança ou crescimento, celebrávamos ambos.
  • Ajuste da equipa. Um tema duro, mas necessário. A Medium chegou a ter 250 colaboradores, hoje tem 77. Não integrei todas as reduções, mas liderei uma delas. Dois pontos: (1) Nenhum responsável agiu de ânimo leve. (2) Num negócio em dificuldade, despedimentos são por vezes inevitáveis. A Medium é sólida com 77 pessoas; teria fracassado com 250.

No controlo de custos, aprendemos uma dura lição com os contratos de arrendamento: os compromissos excedem quase sempre a margem de manobra. Às vezes, não se pode evitar compromissos de espaço que se tornam insustentáveis. Normalmente, seria possível subarrendar espaço não utilizado.

Pagávamos 145.000 dólares/mês por um escritório em São Francisco com 120 lugares desnecessários. Como tantos durante a pandemia, tornámo-nos totalmente remotos, com equipas em todo o país. O escritório ficou obsoleto.

Infelizmente, praticamente todos estavam na mesma situação e o mercado de subarrendamento desapareceu. O senhorio manteve uma posição inflexível—certamente porque precisava de apresentar ocupação ao próprio investidor, contabilizando o nosso piso vazio como “ocupado”. Num edifício com sete pisos e 800 secretárias, talvez 20 pessoas aparecessem por dia—nenhuma da nossa equipa. Fizemos de tudo para rescindir, incluindo pagar antecipadamente apenas para abater despesas de limpeza e manutenção. O senhorio recusou—provavelmente porque precisava do nosso número para negociar dívida. Só depois de concluir o seu acordo nos deixou sair mediante indemnização.

07 Reestruturação de capital—por mais difícil que seja

Esta parte aborda as negociações com os investidores.

Admito não ter experiência nestas matérias, mas apreciei o desafio. A Medium é feita para os curiosos—eu incluo-me. Este tipo de situação só se costuma ler em estudos de caso.

Com ironia, o congelamento do mercado VC ajudou-nos. Restavam-nos dois caminhos: fechar portas ou obter rentabilidade. Num mercado mais forte, os credores teriam forçado uma venda. Em mercado de compradores, a equipa Medium ficou com vantagem: se querem que continuemos, têm de nos compensar—senão saímos todos e os investidores perdem tudo.

Esta negociação chama-se “recap”—reestruturação da estrutura acionista. Inicialmente resisti, pois o instinto empresarial dita que se deve devolver o dinheiro recebido. Mas tive de mudar a mentalidade. Todos os fundadores enfrentam isto: sem limpar a estrutura acionista, não sobra empresa para salvar.

No dia anterior à minha entrada, o amigo VC Ross Fubini reuniu comigo. Entusiasmado pelo plano de recuperação, começou por mencionar o recap. Prometi nunca impor isso aos acionistas. Ele foi claro: sem renegociação, nada feito. Um ano depois, dei-lhe razão.

Faltava definir “como”. Normalmente, um recap é liderado por um investidor “cavaleiro branco”—numa “ameaça de morte”, os antigos acionistas aceitam as novas condições ou deixam a empresa falir.

Mas não tínhamos opções para novos investidores. O mercado congelou e, honestamente, não tínhamos escala para o crescimento “VC-grade”.

Aprendi então sobre dois outros mecanismos de “ameaça de morte”. O primeiro, num artigo “Clean Up Your Own Shite First” de Mark Suster na Medium: novos investidores evitam assumir o papel de vilão—preferem que a gestão faça o trabalho ingrato, até com ameaças de demissão coletiva.

(Nota adicional, isto ilustra o valor comercial do conteúdo amador. Um artigo de UGC gerou milhões em valor. Todos os autores pagos da Medium devem parte do seu rendimento ao texto do Mark. Viva o UGC!)

Recorrer à ameaça de demissão coletiva estava fora da minha zona de conforto. Não era teoria—era um confronto real por mais de 200 milhões de dólares investidos. Ainda assim, a lógica era inescapável: sem recap, a Medium colapsaria e todo o nosso trabalho seria perdido.

Avancei, defendendo ser essencial para novos incentivos à equipa—até perceber que havia 37 milhões em empréstimos prestes a vencer, detidos por vários investidores. Era um risco ainda maior.

O meu método: pedi aos credores que convertessem dívida em capital ou enfrentariam a saída da equipa de gestão—e usei os termos do recap para garantir capitais para eles e demais investidores.

Na essência, o recap implica duas coisas: os investidores abdicam dos direitos especiais—como preferências de liquidação e controlo de governação—e aceitam alterações profundas na sua participação. Se detinham 10%, podiam passar a 1%. Por isso se chama “cram down round”: antigos acionistas são diluídos em favor de novos quadros e equipas.

Formalmente, o recap foi estruturado como uma nova ronda de financiamento. Mas após tantas rondas—Series XX, Series Z—os advogados chamaram a esta a “A prime round”, um recomeço.

Como garantia de justiça, os investidores antigos podiam participar na nova ronda. Apesar das condições exigentes, poderiam evitar ser anulados. No nosso caso, só 6 em 113 aceitaram. Tal baixa adesão provava que não havia benefício próprio.

Para além dos termos, o recap envolveu intenso trabalho relacional—com investidores, antigos colaboradores e a equipa atual.

Os investidores, aliás, foram fáceis de negociar. Como se comprova nos VCs de topo (e tivemos os melhores): procuram “home runs” e evitam disputas tóxicas que prejudiquem a reputação. Não esperava elogiar VCs, mas acho que só posso agradecer a Ross (XYZ), Mark (Upfront), Greylock, Spark e a16z.

Lição essencial: o mercado “zera” empresas legadas. Assim aconteceu com antigos colaboradores da Medium. Tenho amizade com muitos e trabalhei em todos os escritórios da empresa. O seu equity foi igualmente diluído. Contactei alguns diretamente para explicar que as suas ações ficavam praticamente sem valor—embora o recap pudesse dar alguma vantagem, voltar à empresa era a única forma de obter mais. Se já sentiu que “as minhas ações de startup não valem nada”, este é o caso de escola. Não podiam impedir o processo—os meus telefonemas eram apenas um dever profissional.

Foram depois os colaboradores atuais. Alguns tinham ações desde a fundação, todas fortemente diluídas. Custou-me, mas o recap impôs-se. Para ser justo, era preciso limpar o passado e tornar os incentivos futuros relevantes. O passado diluiu-se; apenas contribuições futuras seriam recompensadas. Criámos novo equity com vesting—sem “troca” de ações antigas, nem para mim. Usei a expressão “praticamente sem valor” para descrever as antigas participações: custos de exercício altos, afogadas em preferências de liquidação volumosas e ligadas a uma empresa insolvente. O valor apenas pode ser aferido por um comprador real, mas no pós-recap as preferências de liquidação ficaram abaixo do volume anual de receitas, pelo que o equity da equipa passou a ter valor efetivo.

Este foi o momento em que saímos do buraco. Temos agora contas limpas, lucros, um produto de que nos orgulhamos e uma estrutura simplificada. Compreendo cada vez melhor os advogados: este é um genuíno novo começo.

Recordamo-nos muitas vezes do porquê de insistirmos neste propósito. Não há grande racionalidade comercial—apenas um profundo gosto pela leitura e pela escrita. Apaixonei-me pela Medium há anos porque partilha esse gosto, e quero ver até onde podemos ir com uma base sólida. Sou CEO há três anos, mas admiro a Medium há 13. Por muito irracional que soe, vale a pena salvar esta empresa.

08 Apêndice

Alguns pontos que não cabiam no corpo do texto—este já vai longo.

  • Para colmatar o intervalo entre a decisão e a conclusão do recap, criámos um plano Change in Control (CIC) para os colaboradores. É uma alternativa contratual ao equity—rara, mas tenho gosto em partilhar os modelos com outros fundadores. O plano foi depois substituído pelo recap, mas serviu para proteger a equipa caso o recap falhasse.
  • Subestimei o moral da equipa. Este foi um aspeto central para a retoma—os colaboradores tinham presenciado falhanços sucessivos e não havia motivo para confiar noutro CEO. Baseei-me no princípio “encontre os aliados” do livro The First 90 Days e na ideia de construir confiança no plano—creio que a li numa Harvard Business Review, mas não recordo a fonte.
  • Tínhamos um empréstimo de 12 milhões de dólares não regularizado; foi convertido em equity durante o recap.
  • As avaliações de startups são muitas vezes vaidade. No pico, atingimos 600 milhões de dólares. Não tenho vaidade quanto ao valor atual—mas não o revelo, pois não quero ser comparado com os pares. Somos rentáveis—eles não. É a única métrica relevante.

Aviso legal:

  1. Este artigo é uma reprodução de [Founder Park], originalmente com o título “CEO Retrospective: From $2.6 Million in Monthly Losses to Profitability—How Medium Battled Back from the Brink.” Os direitos de autor pertencem ao autor original [Founder Park]. Caso existam dúvidas sobre esta publicação, contacte a equipa Gate Learn e resolveremos com brevidade.
  2. Aviso: As opiniões expressas neste artigo pertencem exclusivamente ao autor e não configuram aconselhamento financeiro ou de investimento.
  3. Outras versões linguísticas foram traduzidas pela equipa Gate Learn. Não reproduza, distribua ou plagie esta tradução sem a devida referência a Gate.
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